TJDFT julga inadequada a aplicação do Fluxo de Caixa Descontado para apuração de haveres de sócio retirante, conforme jurisprudência do STJ

em Direito Empresarial e Societário

Em recente julgamento da 6ª Turma Cível do TJDFT (Acórdão n. 1652426, Informativo de Jurisprudência n. 473), a Corte observou a jurisprudência do STJ e, por ocasião da apuração dos haveres de sócio retirante, concluiu pela inadequação da metodologia do Fluxo de Caixa Descontado (FCD) para fins de apuração do fundo de comércio (goodwill ou aviamento) da atividade empresarial.

Na hipótese, verificada a omissão do contrato social quanto à forma de apuração dos haveres, o magistrado sentenciante havia estabelecido a aplicação dos artigos[1] 1.031 do Código Civil e 606 do Código de Processo Civil, e logo, o critério de apuração do valor patrimonial apurado em balanço de determinação – isto é, em balanço patrimonial levantado especialmente para a ocasião –, que avaliaria os bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, assim como o passivo contábil.

Entretanto, na perícia realizada no curso da fase de liquidação de sentença, o expert havia utilizado o método do Fluxo de Caixa Descontado, com perpetuidade, para avaliar o fundo de comércio, também entendido como goodwill ou aviamento da empresa. Ao analisar a matéria, o TJDFT, então, observou a jurisprudência do STJ consolidada nos autos do REsp n. 1.877.331/SP, segundo a qual tal metodologia (FCD) não é aconselhável na apuração de haveres de sócio retirante.

O método do Fluxo de Caixa Descontado (FCD), objetivamente, constitui técnica de mensuração de capital em que se determina o valor econômico de uma atividade empresarial, ativo ou projeto, com base na expectativa de receitas futuras trazidas a valor presente por meio da aplicação de determinada taxa de desconto correlacionada ao custo de oportunidade do capital e à perpetuidade do negócio.

Por essa razão a metodologia depende de estimativas – subjetivas – sobre diversos fatores e riscos envolvidos, tais como os riscos de mercado, de eventuais perdas resultantes de políticas econômicas, má gestão da empresa, normas regulatórias e tributárias posteriores, entre outros.

Segundo o precedente da Corte Superior, a aplicação do FDC, como forma de quantificação do valor econômico da sociedade, é justificado no contexto de negociações ou investimentos entre particulares, que fazem suas avaliações individuais e tomam decisões de alocação de riscos e recursos com base em suas convicções.

Entretanto, no contexto do reembolso de sócio que está se retirando, tal metodologia se mostra prejudicial ao ecossistema empresarial e ao modelo liberal econômico, já que o sócio que se desliga estaria tendo assegurado um retorno prioritário sobre o investimento sem assumir os riscos correspondentes, em prejuízo aos sócios que permanecem na sociedade, além de que estimularia o descumprimento de deveres societários pelos minoritários e o exercício do direito de retirada, em prejuízo à estabilidade das operações das empresas.

Por fim, o precedente do STJ é embasado na doutrina especializada ao consignar que a expressão legal “bens intangíveis”, prevista no art. 606 do CPC, que se reporta a uma subclasse de ativos contábeis, não comporta o aviamento, que consiste na subjetiva capacidade do estabelecimento empresarial de gerar lucros futuros.

Com base em tais razões, o TJDFT deu parcial provimento ao recurso da empresa liquidada e determinou a realização de novo laudo pericial, agora observando os parâmetros da sentença, sem associação do FDC para avaliação do fundo de comércio da atividade empresarial.

A matéria, que encontra considerável recorrência na prática empresarial, constitui alerta para a importância da confecção particularizada dos contratos sociais empresariais, sendo certo de que, caso os sócios de determinada sociedade entendam por bem a pactuação do FCD como metodologia de apuração de haveres – ou não –, devem assim fazê-lo no instrumento constitutivo societário.

[1] Art. 1.031/CC. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.

Art. 606/CPC. Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma.

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